sábado, 8 de agosto de 2009

De todas as vezes em que as palavras se embrulham em papel de prata, agrafando, pétala por pétala as sílabas monocórdicas tantas vezes inaudíveis.
De todas as vezes em que não sei onde guardo a chave. O que é levantar voo? As asas perdidas no salão de penas brancas que escorregam e se misturam com a comprida saia de estilo isabelino. A princesa sufoca, desaparece na brisa e afunda-se no oceano. Como um abutre sobrevoo e observo o tempo a perder-se.
Ontem foi um dia interminável, todos os meus mais recentes dias me parecem intermináveis. Sou a Alice perdida no labirinto e por todo o lado encontro paredes erguidas demasiado alto, que me custam quebrar, não tenho força... Quando me tornei no bonito coelhinho branco assustado?
O desespero tranquilo do quotidiano demasiado cansado, sem retorno. Um vulcão adormecido é um vulcão sem vida? Por quanto tempo?
As obras de arte florescem a teu lado e eu evoco o renascimento num lugar de partilha.
A ausência mata, entrego-me à apatia, abandono o pensamento enclausurando-o no escuro de um livro sentado no sofá.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Esta é a história de um humano,
Que achando desumano a vida que levava
Fechou à chave a porta da liberdade!
 
Não há melhor situação
Do que viver na prisão,
Não ter nada que fazer
Senão estar preso e viver!
 
Não ter que comparecer
Comer, dormir e cantar...
Para não me aborrecer
E não ter o que pensar.
 
Mas, neste tão mal estar
Não me conseguem domesticar!
E vivo na selva de verdade,
Ainda que em suposta liberdade.
 
Às vezes renunciei a vontades
E transgredi em todas as idades.
 
Qual deles o pior?
Alguém tem opinião?
Ou a questão não tem solução?

Se eu me conseguisse esconder...

Precisaria de uma capa ou de simplesmente me sentir escondida. Seria só uma sombra numa árvore com um bloco de notas ou um super-herói. Não dos que vivem em casa brancas mas desses que moram num bairro aqui ao pé, onde há o amarelo, o azul e até o rosa por entre o barulho ruidoso das flores que se pede para vender.

Esses super-heróis são iguais a todos nós. Só que alguns usam fatos elegantes e carros mais pomposos. Andam pela rua e escondem-se atrás das janelas. Velhos e novos que passeiam o cão, falam ao telemóvel, escolhem a campainha errada ou fumam um cigarro ou dois... com o nervosinho frio de quem quer voltar para dentro. Para dentro da casa sem entusiasmo, de quem passa o dia a carregá-la às costas ou a tiracolo de um Mac ou de um Pc, preso às contas para pagar e com a indiferença necessária às notícias cansadas que nos chegam todos os dias.

Se eu me conseguisse esconder...

Como quem fica dentro da cabine telefónica a falar horas com um qualquer estranho de quem gostaria de gostar. Como quem pode auscultar a saúde das árvores enquanto caminha devagar e entre pausas conversa com o amigo de longa data. – Faz bem ao coração! – dizem os entendidos; Logo a seguir às refeições.

- Proteja a sua saúde: há produtos ortopédicos, cosméticos ou até homeopáticos abertos das 9 às 20.

- Proteja o seu lugar de estacionamento da ocupação indevida pelo vizinho deslocado que não tem onde o deixar ficar.

- Proteja as águas por onde navega e as janelas por onde espreita, fixando as mãos ocupadas com a imperial do costume à porta do restaurante demasiado cheio.

À espera... à espera de  um lugar confortável à imagem do que projectamos, sem as sirenes aceleradas por mais uma multa, sem a publicidade debaixo da porta e com a esperança como nome de rua.

Se eu me conseguisse esconder...

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Em 1982 nasci, num mês frio que se tem mantido até hoje em contagem decrescente.

 

Mas, se pelo menos me tivessem oferecido aquela bicicleta vermelha tudo teria sido diferente.

De todas as velas que soprei nunca me lembrarei do sopro forte do vento ao pedalar pelos altos e baixos da vida sem aquele medo de me desequilibrar e cair.

Há quem voe até a Holanda para ver tulipas ou vá até à Dinamarca e recorde a sereiazinha, eu, lembro-me das bicicletas que se faziam respeitar e até tinham parques de estacionamento só para elas...

No Brasil pedala-se descalço. Em Nova Iorque não vi bicicletas amarelas, o que foi uma pena porque os táxis são menos arejados e em Londres preferem o labiríntico metro rendendo-se ao facto de ainda não existirem bicicletas com GPS incorporado.

Mas, de todos os lugares, eu só queria ter andado no meu bairro, com aquela bicicleta que me roubaram antes de ter conhecido.

 

Hoje, aperto o cinto com força e no meu lugar apertado recordo todas as vezes em que bateram palmas à minha existência e me senti perdida sem bilhete de destino.

Nesta data querida, recordo os que sempre lá estiveram, os que vieram de passagem e os que permaneceram ao meu lado e deixo que o vento decida a minha próxima viagem.

Inverto o sentido, sem lutar contra os degraus e sozinho cravo com força a vela por mais um desejo que já esqueci.

 

Para o ano trarei confetis!